Ameaçados de expulsão do PT por estarem contra as propostas de reforma do governo Luiz Inácio Lula da Silva, a senadora Heloísa Helena (AL) e os deputados João Batista Araújo (PA), o Babá, Lindberg Farias (RJ) e Luciana Genro (RS) afirmam que não vão recuar de suas posições.
Os quatro foram convocados para uma reunião hoje, em São Paulo, com a Executiva Nacional do partido. “Eu nunca votei contra os trabalhadores e não será essa a primeira vez”, afirmou Luciana. Ontem, num ato público em Porto Alegre, ela lançou a proposta que apresentará hoje à executiva: fazer uma consulta aos filiados do partido sobre o conteúdo das reformas. A deputada gaúcha afirmou estar disposta a seguir as decisões do PT, desde que elas tenham o aval dos militantes. “Eu não acredito que o partido vá fazer expurgos contra deputados que reivindicam o direito de ser o que o PT sempre foi. [José] Genoino [presidente do PT] e os outros companheiros têm todo o direito de mudar de opinião [numa referência à oposição que o partido fazia às reformas]. Mas não podem exigir que façamos o mesmo”, afirmou.
O deputado Lindbergh Farias (PT-RJ) usará em sua defesa um argumento jurídico. “Não há um fato concreto que justifique um processo de punição. Isso é uma norma do Estado democrático de Direito”, disse. No entendimento de Farias, não pode haver punição preventiva, porque ainda não existe voto. “Não mudarei minha posição. Não voto a favor dessa reforma da Previdência. O problema não é só a taxação dos inativos. Vou dizer à Executiva que não temos porque estar sendo ameaçados de punição por defendermos o que o PT defendia há um ano. Lula se elegeu defendendo essas propostas”, disse Babá.
Segundo Genoino os quatro “radicais” extrapolaram as fronteiras do debate político, avançando para a ação, a começar pelo almoço oferecido ao presidente do PDT, Leonel Brizola, por Farias e Heloísa. Contra Babá pesa a participação em uma manifestação de servidores públicos no qual ele teria sido flagrado “vaiando” o presidente Lula. Quanto a Luciana, Genoino lembra que ela foi suspensa por um mês do PT do Rio Grande do Sul por sua sistemática oposição ao governo de Olívio Dutra.
Depois de ouvir hoje os deputados e a senadora a Executiva encaminhará o assunto para que o Conselho de Ética do partido apure se eles infringiram normas partidárias. Caberá ao conselho propor ou não uma punição, que será submetida à votação do Diretório Nacional em junho. A reunião de hoje será dividida em duas partes. Na primeira, líderes no Congresso falarão sobre as reformas. O caso dos radicais ficará para depois.
Plebiscito interno
Os parlamentares da ala radical do PT devem pedir hoje à executiva nacional, durante a reunião, que, antes de qualquer decisão punitiva em relação a eles, seja feito uma espécie de plebiscito interno - com a consulta aos filiados a respeito da sua situação. “Pediremos uma consulta aos filiados. Aceitamos a disciplina interna, mas que ela seja colocada em prática de forma democrática. Nunca votei contra os trabalhadores, e não seria agora que iria fazer isso. A consulta aos filiados é prevista estatutariamente no PT”, afirmou Luciana, em ato do grupo realizado no final da tarde de ontem em Porto Alegre, com a presença de 500 pessoas.
Além do pedido, serão entregues cartas do ministro José Dirceu (Casa Civil) e do presidente nacional do partido, José Genoino, enviadas a aposentados durante o governo de Fernando Henrique Cardoso e condenando as reformas.
A reportagem perguntou ao secretário de organização do PT gaúcho, Vitor Labes, a respeito de alguma previsão estatutária e ele disse desconhecê-la. “Há duas possibilidades previstas para casos de indisciplina: abertura de comissão de ética ou, em caso de falta grave, a expulsão sumária”. Outros petistas se manifestaram ontem, durante o ato, contra a discussão a respeito da disciplina. O deputado estadual e ex-prefeito de Porto Alegre Raul Pont (PT), que integra a tendência “radical” Democracia Socialista, distribuiu nota dizendo que a discussão é inoportuna.
O presidente regional do partido, David Stival, afirmou ser importante esperar a votação dos projetos de reforma tributária e previdenciária para discutir o assunto. “É claro que isso depois deve ser discutido e que o zagueiro não pode deixar de defender seu time”, disse.
Questionada se em caso de expulsão ela e seus companheiros formalizariam uma atitude oposicionista Luciana disse preferir não responder à pergunta, alegando acreditar “que a direção do partido vai ser sensível”. “O ato é em defesa da democracia no PT e dos direitos de os deputados votarem de acordo com sua consciência e as bandeiras que o PT sempre defendeu”, afirmou a deputada, uma das organizadoras do protesto e filha do secretário de Desenvolvimento Econômico e Social, o ex-prefeito de Porto Alegre Tarso Genro.
Além do protesto em si, foi elaborado um abaixo-assinado de petistas, sindicalistas e outros integrantes da sociedade civil. Haverá outros atos como o de ontem em outros Estados. O próximo será no dia 16, em Sergipe. O deputado João Fontes (PT-SE), que esteve ontem em Porto Alegre, afirmou que no encontro de hoje com a executiva federal serão tratados diversos temas que ele considera estar contrariando posições tradicionais do partido. Os temas são amplos, atingindo até mesmo a esfera internacional. Luciana, por exemplo, já reprovou a atuação do governo em relação à guerra dos Estados Unidos contra o Iraque. Pediu ao ministro Celso Amorim (Relações Exteriores). que o governo tivesse uma “atitude mais efetiva”. Em outras palavras, seria a condenação do presidente dos EUA, George W. Bush, pela prática de “crime de guerra” no Tribunal Penal Internacional.
Suplicy defende ala radial
O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) deverá encaminhar hoje à Executiva Nacional do PT um apelo para que os parlamentares integrantes da chamada ala radical do partido não sofram punições partidárias por suas críticas à política do governo federal. No documento o senador afirma que outros petistas também criticaram o governo, porém tiveram um tratamento mais “tolerante”, como a economista Maria da Conceição Tavares e o deputado Paulo Paim (RS). “Os quatro parlamentares sempre tiveram um comportamento muito ativo, sério, característico dos que lutam com toda a energia por suas convicções, qualidades que os fizeram ser sempre respeitados pela base do partido e pela opinião pública”, afirmou o senador. Para ele a reunião deveria definir os procedimentos de atuação dos petistas para os próximos meses.
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