Enquanto o Google se prepara para lançar um sistema operacional próprio que tomará por base o Chrome, seu navegador para a web, todas as atenções estão voltadas para a intensificação de sua competição com a gigante do software Microsoft. Mas o anúncio do Google quanto ao novo sistema operacional também serviu para complicar o relacionamento entre a companhia e a Apple, com a qual ela mantém uma aliança já antiga.
As autoridades regulatórias da Comissão Federal do Comércio norte-americana estão investigando se o Google e a Apple violaram as leis antitruste por compartilharem dois integrantes em seus respectivos conselhos. Eric Schmidt, o presidente-executivo do Google, e Arthur Levinson, presidente-executivo da Genentech, são também membros dos conselhos do Google e da Apple. Nos termos da seção 8 da Lei Antitruste Clayton, empresas com "sobreposição de conselhos" podem sofrer limitações em termos das informações que podem trocar por intermédio dos membros em comum de conselhos.
A investigação está em curso há diversos meses, disseram pessoas familiarizadas com a situação, que pediram que seus nomes não fossem revelados por estarem discutindo um inquérito conduzido de maneira sigilosa.
O novo sistema operacional do Google, que conforme anúncio pode entrar em uso nos laptops de baixo custo conhecidos como netbooks já no ano que vem, provavelmente despertará novas questões para as autoridades regulatórias que estão interessadas no relacionamento entre a empresa e a Apple.
"O círculo de informações de competição potencialmente sigilosas que existe entre o Google e a Apple parece estar se alargando", disse Andrew Gavil, especialista em leis antitruste e professor na escola de Direito da Universidade Howard. "Quanto maior a sobreposição potencial em termos de produtos e de estratégia de marketing, mais a Comissão deve se preocupar sobre possíveis violações da seção 8 da lei antitruste".
Steve Dowling, porta-voz da Apple, se recusou a comentar sobre o assunto.
Matt Furman, porta-voz do Google, também se recusou a comentar. Mas durante um encontro com jornalistas, em maio, Schmidt disse que "da minha perspectiva, não acredito que o Google venha a considerar a Apple como um de seus concorrentes primários".
A Apple e o Google já concorrem no segmento de sistemas operacionais para computadores (com o sistema do iPhone, da Apple, contra o Android, do Google). Também concorrem nos navegadores para internet (o Safari concorre contra o. Chrome), na mídia online (a loja de música e vídeos iTunes contra o serviço de vídeos. YouTube) e em outros serviços, tais como ferramentas para edição de fotos. Schmidt não participa das reuniões de conselho da Apple nas quais o iPhone é discutido.
Mas isso não é o suficiente para satisfazer os críticos do relacionamento entre as empresas.
"A seção 8 da lei antitruste foi concebida por um motivo", disse James Rill, um advogado especializado em leis antitruste no escritório Howrey e antigo secretário assistente da Justiça federal norte-americana. "Trata-se de uma tentativa de criar uma salvaguarda que venha a prevenir possível colusão. Trata-se de uma lei de fácil cumprimento, e seria perfeitamente lícito questionar por que o Google não a vem cumprindo".
Os especialistas em questões antitruste afirmam que processos antitruste sob a cláusula 8 acontecem raramente, porque os membros de conselhos que têm interesses conflitantes costumam renunciar a uma de suas posições quando surgem problemas. O fato de que existam conselheiros em comum não e considerado como problemático caso a receita dos produtos em cujas categorias as empresas competem represente menos de 2% do total de vendas de qualquer das empresas envolvidas.
A Apple aufere bem mais de 2% de sua receita de vendas com o iPhone e o sistema operacional Mac OS X. Mas pode ser difícil determinar se o Google já ultrapassou esse limiar de 2%.
O Google anunciou que oferecerá o sistema operacional Chrome gratuitamente a fabricantes de netbooks, sob uma licença de software de fonte aberta. Isso provavelmente conduziria mais pessoas a utilizar o lucrativo serviço de buscas do Google, e talvez permitisse buscas mais rápidas na web, mas seria difícil determinar o impacto financeiro direto. Os advogados especializados em questões antitruste dizem que a comissão poderia examinar a colaboração entre as empresas usando um padrão diferenciado, a seção 5 da lei antitruste, que proíbe "métodos desleais de competição".
"A Comissão estará altamente atenta para garantir que nada interfira com a inovação que essas duas empresas vigorosamente competitivas vêm oferecendo aos concorrentes", disse David Turetsky, do Dewey & LeBeouf, um escritório de advocacia de Washington, e antigo especialista em questões antitruste no Departamento da Justiça.