A corrida das montadoras pelo carro elétrico pode fazer com que eles se tornem economicamente atraentes em um horizonte de cinco a dez anos, segundo especialistas. Apesar de alguns modelos terem sido colocados à venda recentemente, o preço ainda é maior barreira para a popularização daqueles que, mesmo agora, já são vistos como uma espécie de "tábua de salvação" contra o aquecimento global e uma salvaguarda de consumidores e montadoras em um cenário de oscilação no mercado de petróleo mundial.
Mas, até quanto mais pode custar um carro elétrico para que ele fique atrativo para o consumidor? No caso do Brasil, um estudo feito pela consultoria PSR apontou que o veículo elétrico pode ter um custo de aquisição até 30% superior a um convencional e ainda sim ser mais atrativo em termos econômicos, tendo em vista um horizonte de uso por dez anos. A estimativa foi apresentada no 1º Seminário de Veículos Elétricos e Rede Elétrica, que foi realizado no final de junho no Rio de Janeiro.
Além do custo do combustível (energia elétrica e gasolina), o estudo também foi feito levando em conta custo da manutenção e o fato de que o modelo elétrico não tem valor de revenda ao término do período, pois é necessária a substituição de suas baterias. De acordo com a pesquisa, o custo por km rodado do carro elétrico (levando em conta preço da energia elétrica no Rio) é de R$ 0,09. Já no veículo convencional este valor sobe para R$ 0,27 - ou seja, três vezes mais.
O lançamento do iMiEV, veículo elétrico de quatro lugares da Mitsubishi, exemplifica que essa diferença de preço ainda está longe de ser razoável. Sem subsídios, o carro custa US$ 48.222. Com contrapartida do governo japonês, o custo cai para US$ 33.619. Mesmo assim, o preço é 56,1% superior ao de um modelo básico do Toyota Prius, híbrido gasolina/elétrico que utiliza seu propulsor à energia somente em baixas velocidades.
No caso do projeto do Palio elétrico, que é desenvolvido no Brasil pela Fiat em parceria com Itaipu e a suíça KWO, o custo de produção de uma unidade é de R$ 145 mil - 3,64 vezes mais do que um veículo do mesmo modelo a combustão (R$ 39.770).
Para o diretor de transporte, logística e infraestrutura da Trevisan Consultoria, Olivier Girard, além do custo, o veículo elétrico precisa se tornar mais versátil para cair no gosto do consumidor.
"Se você ainda faz sucesso com o modelo hibrido, é porque você não está tendo confiabilidade com o modelo totalmente elétrico. A utilização somente em cidades acaba limitando (o apelo do produto). Quando você compra um carro, você quer um que possa fazer as duas coisas. Na hora da escolha, a pessoa quer a confiança que vai poder usar o carro em qualquer situação", explica.
De acordo com ele, a limitação de autonomia dos elétricos pode fazer com que eles tenham preferência primeiramente no mercado corporativo. No caso do iMiEV, a Mitsubishi optou por vender as primeiras unidades a empresas e ao setor público japonês. Como neste caso é possível instalar um ponto de recarga próprio, isto também diminuiria outra dificuldade inerente ao carro elétrico neste início: a falta de locais para abastecimento rápido.
Sérgio Granville, diretor técnico da PSR, aponta que, pelos modelos lançados e em projeto atualmente, o tempo médio de recarga na rede residencial deve ser de três a oito horas. Já nos pontos de recarga o abastecimento deve demorar cerca de 30 minutos. Algo que ele ainda considera longe de atrativo para utilização do elétrico em percursos mais longos.
No entanto, apesar do cenário ainda desfavorável, o carro elétrico tem margem para se tornar um produto mais atrativo ao consumidor. De acordo com Girard, o próprio esforço das montadoras em seu desenvolvimento é agora mais independente das idas e vindas do preço do petróleo, que foi a motivação principal em outras épocas. "Agora as montadoras perceberam que o buraco era mais embaixo e estão se preocupando (com o aquecimento global)", diz.
Segundo ele, uma das necessidades é obter baterias que consigam fornecer mais autonomia aos carros com menos peso. Também é necessário ganhar a eficiência da produção em grande quantidade. Para isso, opina ele, ainda é preciso um "empurrãozinho" dos governos, por meio de subsídios que tornem o veículo uma opção para o consumidor.
Para Granville, ainda há uma "grande" margem para o aumento da eficiência das baterias. Ele compara o caso dos veículos elétricos ao dos telefones celulares. "O grande potencial de aperfeiçoamento do carro elétrico é na bateria. É a mesma coisa das baterias de celular, que há dez anos eram mais pesadas e com menos carga. Hoje elas são mais eficientes", aponta.
Já a Fiat brasileira considera uma possível isenção de impostos "fundamental" nesta etapa de desenvolvimento dos veículos elétricos. De acordo com Leonardo Gaudêncio Cavaliere, supervisor de Inovações, Acessórios, Veículos Especiais da montadora, ainda não existe mercado para este tipo de produto no País, mas é preciso investir para nacionalizar componentes e reduzir os custos de produção.
Da bomba para a tomada
Outra preocupação com relação ao veículo elétrico é a transferência de uma grande quantidade de carros que antes eram abastecidos à gasolina ou álcool para as tomadas. Esta questão pode, inclusive, limitar os benefícios ambientais obtidos com o seu uso, devido ao tipo da matriz energética do País.
Segundo o diretor técnico da PSR, no caso do Brasil, 92% da energia consumida provém de usinas hidrelétricas, uma fonte limpa e renovável. Mas, no caso de países desenvolvidos como os Estados Unidos, a matriz tem participação considerável de térmicas a combustíveis fósseis e carvão, o que faz o uso do elétrico ser basicamente "trocar um tipo de poluição por outro".
Conheça alguns projetos na área
Mitsubishi iMiEV
A montadora afirma que o veículo começou a ser produzido no Japão no dia 4 de junho e que conta com 2 mil encomendas até o momento. O carro será lançado inicialmente para o setor corporativo, sendo vendido ao público somente em 2010. A previsão é que sejam produzidas 15 mil unidades em 2011. O preço inicial do carro é de US$ 48.222 (US$ 33.619 com incentivos).
Nissan Leaf
O modelo elétrico da fabricante japonesa foi apresentado no dia 2 de agosto. Com 160 km de autonomia por carga de bateria, o carro atinge velocidade máxima de 140 km/h e, segundo o presidente da Nissan, Carlos Ghosn, se difere da concorrência por não tratar o elétrico como um "nicho" do mercado. A previsão para o início das vendas do Leaf é o final de 2010. A Nissan planeja produzir e vender veículos elétricos globalmente a partir de 2012.
Chevrolet Volt
Grande aposta da GM após um breve período em concordada, o Chevrolet Volt deve ser lançado em 2010. O carro vai permitir rodar até 64 km com uma carga e será equipado com um gerador movido à gasolina, para alimentar o motor elétrico caso a bateria esteja esgotada. Segundo a montadora, o carro terá um custo por km rodado seis vezes menor do que o de um similar movido à gasolina.
Daimler e-mobility
Apesar de ainda não ter um modelo específico para comercialização, a controladora da Mercedes Benz e da Smart está desenvolvendo um projeto em conjunto com a prefeitura de Berlim, na Alemanha, e a RWE para instalar 500 pontos de recarga na cidade. A montadora se comprometeu a doar 100 veículos elétricos das duas marcas à administração municipal, enquanto a RWE vai ficar responsável pela instalação dos pontos de recarga.
Tesla Model S
Após lançar o Roadster, que tinha preço de venda de US$ 100 mil e dois lugares, a Tesla planeja para 2011 a produção seu primeiro elétrico feito em massa, o Model S. Com preço de US$ 57,4 mil (US$ 49,9 mil, após incentivos), o modelo de cinco lugares será destinado aos mercados americano e europeu e terá autonomia de 360 km por carga da bateria.
Palio elétrico
Fruto de uma parceria entre a Fiat, a hidrelétrica de Itaipu e a suíça KWO, o Palio elétrico tem motor de 15 kW (cerca de 20 cv) e faz de 0 a 60 km/h em 9s. O veículo é equipado com baterias recicláveis de Sódio-Níquel-Cloro e tem autonomia de 120 km por carga. De acordo com a montadora, até o final de junho, havia 21 unidades em operação, sendo que a meta é chegar a 50 até o primeiro semestre de 2010. Atualmente, o modelo é utilizado apenas na hidrelétrica e pelos parceiros do projeto, que teve investimento de US$ 10 milhões até agora, de acordo com a Fiat. A montadora também apresentou um off-road elétrico, o Fiat Concept Car II, como carro-conceito no Salão do Automóvel de São Paulo no ano passado.