O correspondente Larry Rohter quase teve visto cassado por ter escrito sobre o hábito de beber do presidente Lula
Da Redação com agências
O jornal norte-americano "The New York Times" publicou ontem reportagem sobre a polêmica em torno da criação de um conselho federal de jornalismo no Brasil, proposta apresentada pelo governo Lula e em discussão no Congresso Nacional.
A reportagem é assinada pelo correspondente do NYT no Rio de Janeiro, Larry Rohter, o mesmo que em maio deste ano escreveu uma matéria sobre o hábito de beber do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na ocasião, Lula ordenou a cassação do visto de Rohter e, em menos de uma semana, desistiu da ordem.
A atitude de Lula na época foi vista como cerceamento à liberdade de imprensa. A reportagem de Rohter sobre o conselho de jornalismo não cita a polêmica entre ele o governo brasileiro no caso do visto cassado. Plano para domar jornalistas os revolta no Brasil
Trecho da matéria de Larry Rohter
O plano do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de criar um conselho Federal de Jornalismo para regular a tempestuosa imprensa brasileira tem provocado crescentes críticas por aqui. As organizações de imprensa que seriam afetadas pela medida a chamam de a mais séria ameaça à liberdade de expressão aqui desde a queda da ditadura militar de direita há duas décadas.
Segundo a legislação, o conselho teria poderes para "orientar, disciplinar e monitorar" os jornalistas, que seriam obrigados a se registrar na entidade, assim como seu trabalho. As penas para violações das regras do conselho variariam de multas à revogação do registro oficial do repórter, que em teoria impediria o infrator de exercer a profissão.
A legislação, que foi apresentada em agosto, tem sido severamente criticada não apenas pelos jornalistas, mas também por grupos de direitos humanos e associações que representam advogados e juízes. Em um protesto típico, a Associação dos Magistrados Brasileiros acusou o governo de sucumbir à "lógica autoritária" e disse que no Brasil não há necessidade de "qualquer órgão com poderes para cercear a liberdade de expressão".
O governo também preparou uma legislação que estabeleceria a Agência Nacional de Cinema e Audiovisual, que teria autoridade para julgar se os programas de televisão estão à altura da "responsabilidade editorial" e para exigir que aqueles que produzem programas de televisão e filmes trabalhem "em harmonia com as metas de desenvolvimento social do país". A proposta tem sido amplamente criticada pelas redes de televisão e por diretores de cinema.
Após prometer "disposição de redefinir os artigos que possam sugerir autoritarismo", o ministro da Cultura, Gilberto Gil, concordou na semana passada em atenuar os termos da proposta para cinema, televisão e rádio.
Mas o governo não demonstrou a mesma disposição de recuar no conselho de imprensa, que será nominalmente um órgão autônomo com algumas características de sindicato.
"Numa sociedade nada é absoluto", disse recentemente Luiz Gushiken, ministro da Secretaria de Comunicação de Lula. Em um encontro público com proponentes do conselho em abril, no palácio presidencial, Gushiken também disse que a mídia jornalística brasileira deveria adotar uma "agenda positiva" e evitar "exploração do contraditório, que fomenta discórdias e conflitos de egos".
De fato, altos membros do governo têm caracterizado os protestos contra a legislação como um exemplo do tipo de abuso da imprensa que o novo sistema visa prevenir. "Querer cercear o debate com uma gritaria, ganhar no grito, que isso é autoritarismo, que isso é cercear a liberdade de imprensa, não me parece razoável, democrático. Isso sim me parece autoritário", disse José Dirceu de Oliveira e Silva, o ministro-chefe da Casa Civil de Lula.
O governo Lula está enfrentando uma série de acusações de corrupção e irregularidades administrativas, todas amplamente divulgadas na imprensa.
(leia a íntegra da matéria do The New York Times sobre o CFJ nesta página)
Reportagem gera novo atrito
A Presidência da República divulgou uma nota criticando a reportagem publicada na edição de ontem pelo correspondente do jornal norte-americano "The New York Times" Larry Rohter. Desta vez o tema da discórdia é a proposta de criação do Conselho Federal de Jornalismo. A reportagem publicada agora tem como título "Plano para domar jornalistas apenas os revolta no Brasil". O correspondente, que mora no Rio, também cita outros projetos que teriam sido apontados como contrários à liberdade de expressão, como a legislação que cria a Ancinav (Agência Nacional de Cinema e Audiovisual).
Segundo a Secretaria de Imprensa da Presidência, o correspondente "limitou-se a reproduzir declarações de pessoas que se opõem ao projeto" publicadas em outros veículos de imprensa. Além disso, diz que o plano do Conselho Federal de Jornalismo não é do governo Lula, mas do Ministério do Trabalho, "atendendo a antiga reivindicação da categoria profissional".
Sobre outro trecho da reportagem, que trata da criação de um código de ética que proíbe os funcionários públicos de dar informações para a imprensa, a Presidência diz que essa proposta ainda está em discussão.
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