A ampliação do número de bolsas de estudo para o acesso de jovens de famílias de baixa renda à universidade privada é uma proposta que vem sendo debatida no Brasil há, pelo menos, uns cinco anos. Numa das suas versões, a que causou mais polêmica, previa o benefício aos candidatos de pele negra ou descendentes dos indígenas. Por sofrer muitas reações (pois o adolescente pode ser branco e pobre), um anteprojeto conciliatório foi enviado pelo Governo Federal ao Congresso, mas ainda não votado, sendo um dos entraves a falta de acordo político entre os congressistas. Este mês, com o argumento de que o prazo dos processos seletivos de 2005 estava se esgotando, o governo resolveu editar uma Medida Provisória sobre o assunto.
Assim é que, no último dia 14, foi publicada uma MP no Diário Oficial da União, regulamentando o chamado Prouni (Programa Universidade para Todos), com o objetivo principal de reservar vagas, com bolsa integral, nas instituições privadas de ensino superior, para estudantes cuja renda familiar é de até um e meio salário mínimo. E desse patamar até três salários, uma bolsa parcial. Está causando nova controvérsia, a exigência de que o aluno candidato ao benefício tenho feito o seu curso médio completo em escolas públicas ou se, em colégios privados, na condição de bolsista integral.
Restam dúvidas sobre a sua eficácia para compensar a péssima divisão de renda existente no País, agravada pelo empobrecimento das famílias de classe média ascendente, que na segunda metade do século passado conseguiam matricular seus filhos em colégios particulares. Em anos recentes, muitas foram obrigadas a transferir os adolescentes das escolas privadas para as públicas, ainda que esse percentual não tenha sido devidamente calculado. Tais dúvidas estariam balisadas no sucateamento gradual, também, do ensino superior. O ensino fundamental que já está sucateado há décadas, promove os alunos que chegarão à universidade sem nenhuma condição ou base de conhecimento então, por sua vez, os professores em sala de aula serão obrigados a nivelar as aulas por baixo, ou seja, o conhecimento a ser transferido aos alunos será inferior e de pior qualidade. No início nada será sentido, mas com a formação de turmas após quatro ou cinco anos, o nível dos profissionais que sairão da universidade poderá ser medíocre. Pior será após a fase de dez e vinte anos quando os professores que substituirão os atuais serão formados por profissionais medíocres. Aí sim estará comprometido todo o processo educacional do país, desde o ensino fundamental até o ensino superior.
A nova MP prevê que a seleção dos beneficiados pelo Prouni será feita a partir dos resultados (notas em classe) e dos perfis socioeconômicos oferecidos pelo Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), afora outros critérios que faltam ser definidos pelo Ministério da Educação. A burocracia pública que envolve uma seleção tão ampla coloca em dúvida se haverá mesmo um número considerável de bolsas oferecidas no próximo ano letivo.
Na sua primeira fase, o Programa deveria pôr à disposição dos alunos pobres cerca de 20 mil bolsas. Mas, de início, só beneficiará o Distrito Federal e mais São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul, Rondônia e Pará. Como se vê, nenhum Estado nordestino foi contemplado, e não se divulgou o critério de escolha das unidades federativas que darão partida ao Programa.
Há outros pendências, em relação às bolsas. O Programa é destinado à ocupação de vagas em instituições privadas. E estas não podem, por imposição da Constituição Federal vigente, ser obrigadas a receber alunos gratuitamente, segundo critérios estabelecidos pelo Governo. Algumas instituições já o fazem, estimuladas por incentivos fiscais, mas sempre se trata de uma participação não-obrigatória, por sua livre e espontânea vontade.
Consta da MP que a negativa de uma instituição de ensino dita “não lucrativa”, mas que cobra mensalidade, a aderir ao Programa, poderá acarretar sua transformação em instituições com fins lucrativos, passando a pagar a quota patronal do INSS, “de forma gradual até atingir o valor integral”. Por outro lado, as que não se dizem filantrópicas mas aceitem um número pré-fixado de bolsistas, passarão a gozar da insenção do Imposto de Renda de pessoa jurídica e também do Cofins e do PIS, pelo período em que existir a adesão. Resta saber, como estamos num sistema capitalista, se o cálculo de custo-benefício estimulará as universidades particulares a aderir ao Programa.
Portanto o problema não resume única e exclusivamente na situação atual de distribuição de renda, mas sim no investimento correto e intensivo no ensino fundamental e no ensino técnico. O presidente Lula precisa parar de discursar um proselitismo absurdo e passar a enfrentar os problemas do país de frente. A imagem internacional é importante não há dúvida, mas ao invés de olhar para o próprio umbigo e trabalhar para solucionar os problemas, o estilo palanqueiro parece ser a principal função de um homem que se porta, ainda, como um sindicalista em porta de fábrica.
Fica o conselho: responsabilidade social e análise do problema de base, esse é o caminho para colocar o Brasil entre as principais potências mundiais. A distribuição de renda se fará pelo próprio movimento de mercado se houverem profissionais capacitados para ocupar cargos e produzir comeficiência.
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